domingo, 15 de dezembro de 2013

O 'ser ateu'


Discussões e mais discussões. Toda vez que nos deparamos com o embate das divergências e amostras das opiniões e explanações religião x ateísmo, podemos perceber que há mais desinformações a respeito do “ser ateu” do que informações lúcidas para se debater. Assim, a dificuldade de se elevar o nível do debate é transcendente ao próprio debate, onde podem ambas as partes faltarem com a visão proeminentemente correta das situações especificas em que se inserem cada debatedor.
Longe de quer mostrar o que é o ateísmo – e muitos parecem nem gostar do termo, diga-se – é preciso mostrar a simplicidade com que este se perfaz na situação do seu ‘usuário’. Aquele que se põe como ateu não segue necessariamente nada! Não se filia, ou abdica, ou questiona ou propõem seja o que for pelo ateísmo, mas pelas suas próprias concepções vividas, diluídas na sua propensão a demonstra-las ou não.

Das associações
Quando se é posto em uma discussão deste aspecto em que um dos interlocutores é ateu, uma posição inerente a isso é que se pergunte sobre o que se julga os “erros da ciência” na concepção do natural. Bem, a concepção do natural se baseia no empirismo e do ceticismo das aplicações nas pesquisas cientificas, que tem se mostrado importantes não apenas para a compreensão do que nos cerca, mas para a melhoria progressiva do meio de vida, ambiente em esferas muitas mais abrangentes que ao próprio ser humano[1]. Sendo assim, ela passa pelos processos mais específicos para que se chegue à conclusão mais próxima da realidade inerente ao ocorrido (ou ocorridos). Mas com isso, há um precedente errôneo: a interpretação de que este ateu é – e subsequentemente todo ateu seria – um cientista e, segundo a visão do questionador, esta resposta seria vazia ou mesmo inexistente. Isso é apenas um argumento das consequências adversas [2][3], tipo de argumento que tenta validar uma afirmação dizendo que seria impossível se ela não existisse. Ou seja, tenta dizer que se é ateu, mas não conhece dos aspectos mais longínquos da ciência não pode ser ateu. Erro!
Esse aspecto não é visto apenas no que se considerar com relação a ciências biológicas e físicas como repassada à concepção de ateus, mas em varias outras, histórica, geográfica, social e demais.

Das concepções
As ideias que cada pessoa pode ter de si, do entorno se diferenciam através da cultura e sociedade em que o indivíduo provém, bem como – muitas vezes, mas não o tempo todo – das formalizações de opiniões angariadas por este no limiar da vida também depois de adulto. Assim, dizer que um ateu deve ou não ter uma determinada visão passa longe do real que vertem este individuo. Infelizmente, é comum encontrar entre os adeptos da descrença paradigmas que provêm dos preconceitos estabelecidos pelos nichos religiosos. Estes nichos, algumas vezes não foram criados pela religião predominante – o que é raro, diga-se – mas a mesma faz questão de mantê-los para o controle dos seguidores e manutenção do poder, status. Acaba, por tanto, sendo irônico que aqueles pressupostos se mantenham na ideia do ateu, mas isso não o torna “mais ou menos” ateu. É um indicativo de se observar a origem do ateísmo do indivíduo, e isso é importante para se estabelecer a conexão entre a descrença deste e o fator que o levou a tal. Por que é importante? Por que podemos inclusive entender qual o ponto de dificuldade para se compreender a fraqueza humana e social quando mitigado à religiosidade regional.
Sendo assim, a propensão de encontrar pessoas tão resolutas às ideologias frívolas e lenientes até extremamente comum, e isso não o torna – como já dito – “mais ou menos” ateu. É de se esperar que com as percepções do conhecimento e entendimento da racionalidade em interpretar a nós mesmo essa massiva vertente seja fundida a realizações mais em prol do humanismo, liberdade de ações e compreensão do diferente. A mudança deste se faz necessário não para o ateísmo, mas para si mesmo.

Das argumentações
Uma discussão se desenvolve com argumentos, e não cito aqui sua validade (mesmo sendo óbvio que quanto melhores forem melhor o nível da conversa). O que nos move a continuar na mesma é que possivelmente sempre veremos ter o que falar e passar. Mas não é assim que ocorre, mesmo que não seja de toda falsa essa impressão. É comum a discussão tornar-se redundante quando não a compreensão do que o outro passa, do que este entende e a que conclusões tiraríamos disto.
Mas o ponto do conhecimento é que ele é limitado aos indivíduos, e isso não falha aos discursores. Então, propõe-se que se o ateu não consegue – por quaisquer motivos que sejam – dar andamento na conversa, ou o mesmo não é “ateu o suficiente” ou o ateísmo não dá respostas cabíveis. E dai vemos novamente uma falácia, a do apelo à ignorância 23, onde qualquer coisa não se tenha provado algo, logo seria o contrario desta. Uma argumentação – ou a falta dela – não prodizem o ateísmo, tampouco o perfazem, o sintetizam. A argumentação provém da competência do argumentador em explaná-la. Lógico que aqui fala-se da argumentação, e não do objeto a ser argumentado, pois este lá esta independentemente de seu defensor ou detrator saber seus pormenores.
É sempre importante o conhecimento do que se argumenta, do que explana. Ou seja, para melhor nos identificarmos com uma boa discussão, conhecer o máximo possível mostra a insistente vontade humana em aprender, em evoluir e se manifestar a tal. Mas conhecer as limitações torna-se imprescindível para melhor os argumentos e, consequentemente, a discussão. As limitações podem nos levar a querem compreender sempre mais.

Mais erros: fonte
Há também aquelas que se perfazem por fontes, baseando-se apenas nelas sem qualquer informação adicional por parte do divulgador. Colocar uma reportagem, por exemplo, intitulada “Novo estudo científico confirma o Gênesis: a vida humana teve origem no barro”[4] não facilita para qualquer tipo de proposição, pois a mesma não cita fontes quando verificada especificamente. E essa dificuldade, se não percebida no início, desgasta a conversa a ponto de, a partir da premissa equivocada, desconstruir todo o debate.
Mas o erro acaba por ocorrer de varias partes. As citações bíblicas que demonstram erros crassos na concepção natural são algumas delas. Por mais que possam existir pessoas que possuam o ideário de que as citações escatológicas são vertentes reais, referendá-las como ignorantes não ajuda em nada a argumentação. Pelo contrario, distância o caminho do entendimento, quase que como uma barreira entre interlocutor e ouvinte. É inegável a dificuldade de se dialogar com estas implicações, seja de qual ‘lado’ for. Por isso, acaba-se por esperar que o ateu tenha o discernimento ideal. Mas por quê? Por este ser propenso e aberto? Não, o ateu – repetindo – é apenas e simplesmente a descrença. Não se pode imputar e tão pouco exigir que este aja desta maneira. O conhecimento e vontade de tê-lo o farão a este indivíduo.

Da militância
Outra crítica muito difundida é que a militância ateísta é algo incompreensível. Não vejo onde. A militância é apenas o ato de divulgar uma ideia, significa ser membro ativo de uma causa, exercer ativamente uma profissão[5]. Isto nunca foi exclusividade religiosa, mas de toda a ação humana no decorrer dos séculos, de sua evolução social. Assim, é natural que pessoas adeptas do ateísmo queiram-no divulgá-lo. E em vista do que se é possível observar no decorrer dos acontecimentos, é natural que pessoas não adeptas às barbáries promulgadas pela concepção religiosa queiram mostrar o lado distinto disto. Mas lógico que, em vista de probabilidade, o contrario possa ocorrer, mas com poucas chances.
Citações falseáveis e falaciosas a respeito de governos ateus, e o mais comum é o aditado à U.R.S.S.[6], onde o “estado ateu” seria responsável por chacinas e terrorismo sem igual, e repetido e repetido por gerações. Não foi bem assim, aliás, longe de sê-lo. O máximo de estado realmente ateu que houve foi na Armênia entre 1967 e 1991, durante regime comunista na região. A instituição eclesiástica era proibida e sua alegação era a de que era “importação estrangeira” e eram proibidas ideias estrangeiras (não acredito que o comunismo fosse ideia natural armênia)[7]. Este, junto com outros governos, acabou por perfazer um terror envolto de ideias que não lhes prestavam serviços, pois a superstição – má vista e entremeando pelo desincentivo e a proibição – voltou com força total após estes regimes totalitaristas, para desalento da real pesquisa e divulgação científica. Mas isto é somente mais uma vertente da necessidade de pessoas se perfazerem politicamente e manter seu poder e sua influência.
No fim, a compreensão importante é a já citada: ser ateu é ser simplesmente descrente da existência de entes divinescos, sejam estes quais forem. Mas isso não impede nuances, que a princípio possam parecer incompatíveis com o ateísmo, não lá se encontre. Por tanto, acaba por ser importante que todos aqueles passem pelo prodígio da compreensão da humanidade deem o reforço necessário àqueles que as desconhecem, e até mesmo as ignoram. Não é fácil, não é nem mesmo primoroso, mas talvez seja a última cartada para uma humanidade manquetola, onde a muleta repele a vontade de aprender a andar novamente.

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