domingo, 26 de abril de 2015

Respostas a alguns questionamentos criacionistas - por Fabiano Menegídio


No último dia 07 de abril, o grupo AAUSA: Ateus e Agnósticos da UFRRJ - Sociedade Ateísta organizou o 1° Encontro Nacional de Ateus e Agnósticos Universitários, onde alguns palestrantes discorreram sobre temas relacionados a Evolução x Criacionismo. Durante todo o dia, das 09:00 às 21:00hs, abordamos o tema, inclusive, abrindo espaço para quem tivesse o interesse de participar, interagindo, questionando e agregando conhecimento ao evento.

As palestras e os debates que foram realizados durante o evento podem ser visualizadas nesta PLAYLIST
Eis que após o evento, os organizadores do evento recebem um e-mail de um graduado na mesma universidade com alguns questionamentos sobre o evento que estão expostos abaixo, apenas protegendo o nome do emissário, afim de evitar-lhe possíveis constrangimentos e com as devidas respostas elaboradas pelo pelo mestrando em Biotecnologia pela Universidade de Mogi das Cruzes, Fabiano Menegídio. Atuando nas áreas de Genômica Funcional, Genômica Estrutural e Transcriptoma com ênfase em Bioinformática. Especialização em Metodologia de Ensino de Ciências da Natureza e Especialização em Filosofia. Bacharel e Licenciado em Ciências Biológicas com Formação Específica em Gestão Ambiental. Atuação na divulgação acadêmica e no jornalismo cientifico, principalmente sobre a Teoria da Evolução, no blog Evolution Academy e no projeto Universo Racionalista.



Ateus e Agnósticos da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro - Sociedade Ateísta

A propósito do Encontro Nacional de Ateus e Agnósticos Universitários promovido por vossa associação, eu, lamentando não ter podido estar presente, quero apresentar algumas considerações sobre a controvérsia Evolução x Criacionismo, tema da vossa reunião deste ano.

1° - A Teoria da Evolução de Charles Darwin é aquilo que o próprio nome indica: Uma teoria. A ciência, como sabem, é um cemitério de teorias. Hoje uma teoria pode nos parecer razoável, mas amanhã perde totalmente a confiabilidade e é posta de lado. Isto pode vir a acontecer à Teoria da Evolução, como aconteceu, por exemplo, com as teses de Lamarq ou as teses iluministas segundo a qual um monte de lixo a um canto gera a formação de ratos, sem necessidade de intervenção divina...Esta tese lá pelos idos do século XVIII chegou a ser o "must" em termos de dialética materialista."

Prezado,

Agradecemos o e-mail encaminhado com relação ao nosso evento e lamentamos que não tenha comparecido para tratarmos dos pontos levantados por você durante o mesmo.

Sobre suas considerações, devo apresentar algumas objeções fundamentadas em artigos científicos publicados em revistas peer-reviewed e livros técnicos de grande circulação no meio acadêmico.

RESPOSTA DE FABIANO MENEGÍDIO:

Sobre sua primeira frase, devo concordar com você. A Teoria da Evolução (desde o Darwinismo proposto por Charles Darwin em seu livro Origem das Espécie, passando pela Síntese Evolutiva que contou com os maiores geneticistas de população do início da metade do século XX e o acréscimo das ideias de Mendel e as novas descobertas científicas que permitiram uma proposta para uma Nova Síntese Estendida) realmente é uma TEORIA.

O grande problema posterior é que você comete uma falha epistemológica básica com relação a uma área de extrema importância para a ciência: a Filosofia da Ciência. O conceito de teoria na Filosofia da Ciência difere extremamente do apresentado pelo senso comum, que utiliza a palavra com a conotação de especulação, algo duvidoso, incerto. Uma teoria científica é um conjunto de explicações sobre um certo tipo de fenômeno, ou um grupo de fenômenos semelhantes. Um outro ponto que deve ficar claro é que ela é uma síntese aceita de um vasto campo de conhecimento, consistindo-se de hipóteses necessariamente falseáveis que foram e serão permanentemente e devidamente confrontadas entre si e com os fatos científicos, fatos estes que integram um conjunto de evidências que, juntamente com as hipóteses, alicerçam o conceito de teoria científica. Uma teoria cientifica reúne todos os fatos relevantes sobre algo, fornecendo uma explicação que se encaixa a todas as observações e pode ser usada para fazer previsões. Na ciência, a teoria científica é o objetivo final, a explicação. É o maior nível de comprovação dentro da ciência. Logo, quando você utiliza a palavra teoria de forma negativa, como no seu texto, demonstra um total desconhecimento de Filosofia da Ciência e de epistemologia.

Você também demonstra um desconhecimento sobre o conhecimento científico quando utiliza o caráter temporal de suas explicações como se fosse algo negativo. O conhecimento científico tem um caráter histórico e temporal justamente por ser constantemente e devidamente confrontado entre si e com os fatos científicos e pela necessidade inerente de falseamento. Logo, uma teoria ser confrontada com novas e acabar refutada ou sofrer mudanças é uma característica extremamente positiva e que demonstra a evolução do fazer científico. Essas características diferenciam o conhecimento científico dos conhecimentos filosóficos, de senso comum e religioso, esse último pautado em dogmas que não sofrem atualizações e se baseiam em um ponto fundamental e indiscutível das religiões.

Baseado no senso comum, muitas pessoas acreditam que quando uma teoria se torna bem estabelecida e atinge uma grande aceitação científica acaba se tornando uma lei cientifica, sendo essa mais uma concepção extremamente incorreta. Uma teoria nunca se torna uma lei. Leis científicas descrevem eventos repetitivos e observáveis, enquanto teorias explicam como esses eventos ocorrem. Se houvesse uma hierarquia na Filosofia da Ciência, as teorias seriam maiores do que as leis. Não há nada maior ou melhor do que uma teoria na Filosofia da Ciência.

As teses de Lamarck realmente foram confrontadas com novos dados empíricos e foram falseadas, graças principalmente aos experimentos de August Weismann. Mesmo com as bases da teoria lamarckista sendo confrontada, hoje temos conhecimento que muitas de suas hipóteses são aplicadas na área da Epigenética. Recomendo que leia detalhes sobre essa área e como as ideias de Lamarck voltaram ao meio científico. Como sugestão de leitura sobre o tema, deixo o livro Evolução Em Quatro Dimensões de Eva Jablonka. Abaixo temos 4619 artigos tratando do tema que acredito validar o ponto levantado acima:

http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/?term=epigenetics+review

Já a “tese iluminista” que você se refere possuí um nome: geração espontânea. Realmente essa hipótese foi defendida por diversos cientistas e filósofos no decorrer da história da ciência. Essa hipótese só foi desacreditada pela comunidade científica depois dos experimentos realizados por Pasteur e Tyndall que comprovaram em definitivo a impossibilidade de surgimento de seres vivos totalmente formados a partir da matéria inanimada num curto espaço de tempo e não que a vida extremamente primitiva não possa se formar a partir de moléculas cada vez mais complexas. Para não alongar essa resposta, recomendo o artigo abaixo que trata do tema e responde esse ponto levantado por você, chegando a se aprofundar no tema da Abiogênese e outros temas da origem da vida:

http://www.scielo.br/scielo.php...

Por último, recomendo fortemente que leia livros sobre Filosofia da Ciência, pois sua critica é pautada justamente em um desconhecimento básico do que é uma teoria científica, uma lei científica, hipóteses cientificas e fatos científicos. Além disso, você comete diversos erros relacionados a metodologia cientifica que comprometem uma crítica consistente.

Como sugestão de leitura, deixo dois livros dos principais filósofos da ciência que sustentam todas as afirmações realizadas acima:

Popper, Karl. (1996). A Lógica da Pesquisa Científica. SP. Ed. Cultrix.

Kuhn, Thomas. (1962). The Structure of Scientific Revolutions. University of Chicago Press. 2ª edição.

Além disso, sugiro o livro abaixo em português que explica o que realmente é ciências, como funciona sua metodologia e as diferenças dos tipos de conhecimento científico:

http://www.nelsonreyes.com.br/A.F.Chalmers_-_O_que_e...

"2° - A Teoria da Evolução continua sendo uma teoria, pois jamais se pôde observar uma determinada espécie evoluir para outra. A evolução das espécies não foi comprovada cientificamente. Mas, ao invés de ser considerada apenas uma teoria que os seus apoiantes procurariam provar cientificamente - coisa que ainda não conseguiram, repito -, passou a ser, isto sim, uma espécie de "credo" quase que religioso, a que é exigida fé absoluta, sem questionamentos, sob pena de excomunhão do mundo "dos vivos"."

RESPOSTA DE FABIANO MENEGÍDIO:

Como comentei na resposta anterior, podemos observar que sua crítica se baseia justamente em uma falta de conhecimento epistêmico, tendo em vista que você atribui que a Evolução Biológica é “apenas uma teoria” e apresenta como argumento o fato que ela “não pode ser testada”. Dois pontos importantes para classificar uma hipótese como teoria é ela ser: falseável e testável. Você classificando a Evolução como teoria já está afirmando que cumpre essas duas premissas essenciais. Essas informações podem ser confirmadas no livro que disponibilizei acima. Boa parte de sua segunda crítica está respondida na primeira e no livro fornecido, por isso vou me centrar apenas na questão da especiação.

Você afirma em sua crítica que especiação nunca foi vista. Essa afirmação torna-se extremamente engraçada, pois conforme sua assinatura, você é formado em zootecnia. TODOS os animais que você trabalha são frutos do processo de Seleção Artificial que é a aplicação da Seleção Natural de forma coordenada. Bois, porcos, cachorros, galinhas, milho, banana são grandes exemplos de processos de especiação através de seleção artificial. Só essas afirmações já refutariam a ideia de que “jamais se pôde observar uma determinada espécie evoluir para outra”. Quando o primeiro hominídeo resolveu desenvolver e aprimorar as potencialidades dos animais domésticos e domesticáveis, com a finalidade de incrementar sua produção como fonte alimentar e outras finalidades (por sinal, a descrição de sua profissão) e iniciou um processo de reprodução diferencial, geração de variação e seleção da prole através de características fenotípicas desejáveis, estava promovendo um processo evolutivo que muitas vezes levou a uma especiação.

Apenas falando sobre o gado doméstico, existem inúmeros trabalhos que demonstram o processo de especiação do auroque para ele. Segue abaixo artigo que trata do tema. Ele apresenta uma literatura suplementar em suas referências bibliográficas e uma simples busca em um repositório de artigos apresentará muitos outros:

http://dx.doi.org/10.1371%2Fjournal.pone.0009255

Quando falamos de especiação em ambiente natural, temos mais evidências ainda sobre o processo. Essa crítica é extremamente simplista que grande parte dos criacionistas nem a utilizam, aceitando pelo menos o surgimento de novas espécies para adequar a sua tentativa de explicação denominada Baraminologia.

Abaixo artigos tratando do surgimento de novas espécies:

http://www.talkorigins.org/indexcc/CB/CB910.html

Abaixo uma revista científica que trata apenas da descrição de novas espécies:

http://mapress.com/zootaxa/collections/nova/index.html

Mais uma vez você demonstra um total desconhecimento filosófico, histórico e biológico quando faz suas afirmações. Negar o surgimento de novas espécies é um dos sinais mais clássicos de fundamentalismo, tendo em vista que podemos ver espécies surgindo em curtos espaços de tempo. Espécies em anéis são grandes exemplos e muito bem estudados por biólogos e outros cientistas. Recomendo mais uma vez que busca artigos científicos sérios e que os leia, antes de expressar opiniões sem nenhum tipo de embasamento, além do negacionismo:

http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/?term=speciation+review

"3° - A Teoria da Evolução está longe de explicar satisfatoriamente todos os fenômenos do mundo material, de modo especial o surgimento da vida e o surgimento do próprio Homem, que é matéria e espírito. Como o espírito poderia provir da matéria bruta?"

RESPOSTA DE FABIANO MENEGÍDIO:

Desde o seu surgimento, a Teoria da Evolução não tenta explicar a Origem da Vida e nem a do Universo, mesmo ambos sendo fatores importantes para que a Evolução exista. Da mesma forma que não precisamos de um conhecimento histórico de como surgiu o primeiro automóvel para dirigi-lo e entender seu funcionamento, não precisamos saber quais foram os fatores relacionados ao surgimento da vida para entendê-la e analisarmos se a mesma evoluiu ou não. Para a Teoria Sintética da Evolução não importa se a vida surgiu pela hipótese heterotrófica, pelos modelos hidrotermais, pelos modelos abstratos, pelos modelos metabólicos, através do “Mundo de RNA”, pela Panspermia, pela Ecopoese, por uma ação divina, através de testes alienígenas, ou qualquer outra concepção; o que importa é que após o seu surgimento, a vida não permaneceu estática na Terra como defendido pelos Fixistas e que essa vida teve uma ancestralidade comum com base em todas as evidências corroboradas. Logo, sua terceira crítica à evolução se baseia em um desconhecimento do escopo teórico da evolução e das teorias que realmente pretendem explicar a origem da vida. A teoria evolutiva não tenta explicar TODOS os fenômenos do mundo material, nunca foi seu escopo e nenhum biólogo evolutivo apresenta esse objetivo. O artigo que recomendei na resposta sobre geração espontânea e abiogênese trata dessa questão e volto a recomendá-lo. Também recomendo que leia livros acadêmicos sobre a teoria evolutiva para compreender seu escopo, como sugestão deixo os livros abaixo:

RIDLEY, Mark. Evolução. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2006.

FUTUYMA, Douglas. Biologia Evolutiva. 3. ed. Funpec. 2009.

FREEMAN, Scott; HERRON, Jon C. Análise evolutiva. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2009.

A conclusão de sua crítica comete mais um erro epistêmico básico e por isso, volto a sugerir que leia a literatura básica recomendada sobre Filosofia da Ciência. Sua crítica é centrada em uma hipótese ad hoc relacionada a existência de uma característica metafisica ao ser-humano denominada “espírito”. Essa característica não possuí qualquer evidência cientifica e não pode passar pela metodologia científica, pois não pode ser falseável e muito menos testada. Com base nisso, ela não é do escopo da ciência, mas sim da teologia que é um ramo da filosofia. Nesse momento entramos novamente na diferenciação dos tipos de conhecimento. A ciência é pautada em um naturalismo metodológico, que é bastante diferente do naturalismo filosófico. O escopo da ciência se centra no que é natural, pode ser falseado e testável.

A teoria da evolução por ser um conhecimento científico não se preocupa com questões metafísicas ou teológicas. Logo, dizer que a evolução não explica o espírito é irrelevante, tendo em vista que essa característica é uma hipótese ad hoc que não pode ser testada e nem falseada, não tendo qualquer tipo de respaldo cientifico.

Sobre a origem do homem, realmente não temos todas as respostas. Mas graças a Genômica funcional, Proteômica e outras áreas da Biologia Molecular, conseguímos obter um grande número de evidências que validam uma ancestralidade comum e que o ser humano é produto de um processo evolutivo.

O link abaixo trata justamente da evolução humana e indica diversos artigos relacionados. Recomendo também a literatura complementar na referência bibliográfica de cada artigo:

http://evolutionacademy.bio.br/.../comparacoes-geneticas.../

"4° - A Teoria da Evolução pretende dar uma explicação para a diversidade de formas de vida presentes sobre a Terra, mas a evolução tem de partir de alguma coisa, de modo que o ato criador de Deus continua sendo necessário para explicar a realidade."

RESPOSTA DE FABIANO MENEGÍDIO:

Como já expliquei em uma resposta anterior, para a Teoria Sintética da Evolução não importa se a vida surgiu pela hipótese heterotrófica, pelos modelos hidrotermais, pelos modelos abstratos, pelos modelos metabólicos, através do “Mundo de RNA”, pela Panspermia, pela Ecopoese, por uma ação divina, através de testes alienígenas, ou qualquer outra concepção; o que importa é que após o seu surgimento, a vida não permaneceu estática na Terra como defendido pelos Fixistas e que essa vida teve uma ancestralidade comum com base em todas as evidências corroboradas.

Sua critica não é direcionada a teoria evolutiva, mas as hipóteses de origem da vida. Como apresentei anteriormente, existem diversos modelos que explicam grande parte da origem da vida sem a necessidade de uma intervenção sobrenatural. Logo, afirmar que um criador "é necessário" torna-se uma falácia de apelo a ignorância e Deus das Lacunas, não um argumento válido. Uma criação sobrenatural é uma hipótese FILOSÓFICA e TEOLÓGICA aceitável, mas não uma hipótese científica. Como dito desde o inicio desse, para se tornar uma teoria científica a hipótese deve ser testável e falseável, sendo que o sobrenatural não cumpre essas duas premissas. Para ser ciência, a hipótese deve passar prelo crivo da metodologia científica que se baseia em um naturalismo metodológico.

Mais uma vez podemos visualizar que suas considerações se baseiam em um total desconhecimento da Filosofia da Ciência e sobre demarcação científica. A leitura de Popper e Kuhn sugeridas na primeira resposta é extremamente válida para desmistificar todos os conceitos incorretos que permeiam suas considerações.

"5° - Nós, os criacionistas, não negamos absolutamente a existência da evolução das espécies. O que nós afirmamos e provamos racionalmente é que existe o ato criador divino, sem o qual nenhuma realidade existiria. Se este ato criador ocorreu só no início do mundo ou se se repetiu no decurso da história é irrelevante. Criar é tirar algo do NADA. Isto nem os mais entusiastas evolucionistas pretendem que o evolucionismo tenha este condão."

RESPOSTA DE FABIANO MENEGÍDIO:

Essa consideração é extremamente interessante, pois demonstra uma total incoerência com sua segunda crítica, aonde afirma que nunca foi visto até o momento o processo de especiação ocorrendo.

Ela já foi respondida anteriormente. Mais uma vez você confunde o escopo de diversas teorias científicas. Realmente a Teoria da Evolução não diz que tudo surgiu do nada, nem mesmo a Biopoese que trata da origem da vida faz essa afirmação. Nem a Teoria do Big Bang faz essa afirmação.

A biopoese propõe o surgimento da vida desde moléculas simples até formas mais complexas, onde essas moléculas precursoras estariam entre a “vida” e “não vida” de forma muito similar aos príons e vírus hoje. Dentro dessa visão de origem existem diversas hipóteses de como foi o surgimento da vida, sendo que todas são órfãs e não fazem parte da Síntese Evolutiva. Uma dessas teorias seria a heterotrófica criada por Oparin que defende que compostos orgânicos teriam sofrido reações em um ambiente aquoso que os levava a níveis crescentes de complexidade molecular, eventualmente formando agregados coloides, ou coacervados. Dentro dessa definição de abiogênese também temos a hipótese do “Mundo de RNA” proposta por Walter Gilbert, em que o mundo atual com vida baseada principalmente no DNA e proteínas foi precedido por um mundo em que a vida era baseada em RNA. Essas duas teorias não são as únicas hipóteses que tentam explicar o surgimento da vida dentro desse contexto de abiogênese existindo muitas outras, como a Panspermia (surgimento da vida fora da Terra) e a Ecopoese. Além disso, essas teorias podem ser complementares e não trabalharem de forma isolada, pois poderíamos ter um surgimento da vida por processo de Panspermia baseada em formas de RNA e sua evolução para a vida composta de DNA.

Mesmo o Big Bang diz que a energia do universo sempre existiu, o que é bem diferente. Logo, sua visão mais uma vez é um desconhecimento das teorias que tenta criticar. É um simplismo epistêmico. Todos esses temas são tratados no artigo que sugeri sobre a geração espontânea.

Por último, suas considerações apresentam na entrelinha uma tentativa falha de interligar a teoria evolutiva com uma visão ateísta. Cosmovisões são de cunho pessoal e podem ser reforçadas por evidências científicas, por exemplo, mas teorias científicas e a ciência é completamente agnóstica em relação a divindades e o sobrenatural. Se não pode ser testado e falseado, não faz parte do escopo da ciência. Outro ponto que vale ser citado é que diversos cientistas importantes na teoria evolutiva são teístas, mas não criacionistas. Exemplos de evolucionistas teístas são: Alfred Wallace, Asa Gray, Pierre Teilhard de Chardin, Ronald Fisher, Theodosius Dobzhansky, entre muitos outros. Hoje também temos grandes nomes, como por exemplo, o Francis Collins, diretor do projeto Genoma.

A grande diferença dos evolucionistas teístas para os criacionistas é que eles sabem que o processo evolutivo não necessitam de uma divindade coordenando seus detalhes. Segue abaixo um resumo dessa cosmovisão apresentada por Collins em seu livro “Alinguagem de Deus”:

1. O universo surgiu, há aproximadamente 14 bilhões de anos (pela imposição de leis por Deus);

2. Apesar das improbabilidades incomensuráveis, as propriedades do universo parecem ter sido ajustadas para a criação da vida;

3. Embora o mecanismo exato da origem da vida na Terra permaneça desconhecida, uma vez que a vida surgiu, o processo de evolução e de seleção natural permitiu o desenvolvimento da diversidade biológica e da complexidade durante espaços de tempo muito vastos;

4. Tão logo a evolução seguiu seu rumo, não foi necessária nenhuma intervenção sobrenatural;

5. Os humanos fazem parte desse processo, partilhando um ancestral comum com os grandes símios;

Mais uma vez, as sugestões de leitura se tornam essenciais para suas considerações.

"6° - Nós, os criacionistas,não achamos que as descrições da Criação Divina contidas no livro do Gênesis pretendam ser um relato físico/químico/geológico/biológico/paleontólogico da formação do mundo. A Bíblia é um livro religioso, a sua mensagem principal é religiosa, isto é, trata das ligações entre o Homem e o seu Criador Divino. Como disse o católico Galileu Galilei a propósito da movimentação dos astros, a Bíblia não nos diz como anda o céu, mas como se vai para o Céu. A sua finalidade é muito mais importante. Aliás, nem Charles Darwin, em absoluto, achava que a sua tese evolucionista dispensaria a existência de Deus para explicar a realidade. A própria descrição do Genesis mostra a formação do mundo ao longo do tempo, "evoluindo" dos serem inferiores para os superiores, até chegar ao Homem. Este, apesar da sua proeminência sobre tudo o que havia sido criado até então, é tirado de uma matéria pré-existente, o "barro" sobre o qual Deus "sopra" o espírito.

Sendo o que me parece necessário ponderar, despeço-me cordialmente,

De "Um ruralino criacionista"

Zootecnista formado na UFRRJ

RESPOSTA DE FABIANO MENEGÍDIO:

Em sua primeira frase, você tenta demonstrar uma hegemonia inexistente no meio criacionista. Uma de nossas palestras tratou justamente dessa falta de hegemonia entre os criacionistas:

https://www.youtube.com/watch?v=jTl15RUVCHQ

Apenas para falar de dois tipos específicos de criacionistas, devemos lembrar que Criacionistas da Terra Jovem, diferente do que você apresenta, acreditam na literalidade da escritura bíblica e que ela apresenta um relato científico inspirado por sua divindade desde a sua primeira página até o fim. No Brasil, os adventistas são exemplos dessa corrente. Ken Ham e seu Museu da Criação é um outro exemplo extremamente conhecido.

Logo, seu relato sobre sua interpretação da bíblia é de cunho pessoal e não condiz com a categoria denominada “criacionistas”. Sua frase não condiz com o posicionamento de todos os criacionistas. Poderíamos classificá-lo dentro da corrente do Criacionismo da Terra Antiga, que não nega a idade da Terra, mas mesmo dentro dessa corrente temos diversas subcategorias. Alguns acreditam na literalidade bíblica mudando apenas a interpretação dos 7 dias que corresponderiam a anos ou milhares/milhões/bilhões de anos, outros tratam a bíblia de forma alegórica e diversas outras interpretações são possíveis e conhecidas.

Toda sua apresentação tem um valor teológico, mas nenhum valor científico, como você perceberá quando ler a literatura de Filosofia da Ciência sugerida. Quando falamos de evolução biológica, estamos falando de uma teoria testada e validade durante mais de 150 anos. A interpretação teológica sobre seus resultados ou mesmo filosóficas não interessam para a ciência e não mudarão os fatos estudados e validados. Recomendo que leia os livros sugeridos no decorrer das respostas, os artigos e literatura suplementar. Espero que entenda a diferença entre um conhecimento científico e teológico, além de compreender que suas criticas se baseiam em uma falsa dicotomia. Uma teoria científica não existe para validar ou invalidar uma visão teológica, mas pode ser usada por outras áreas do conhecimento como evidências favoráveis em seus discursos.

Sabemos que o conteúdo é extenso e que os questionamentos demonstram total falta de conhecimento científico e que de certa forma, seria desnecessário perdermos tempo respondendo tais questionamentos, mas acreditamos que a melhor forma de disseminar o conhecimento é assim, argumentando.

Eu, J.C, agradeço a paciência e disponibilidade do amigo Fabiano.

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